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segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Sapatos de camurça azuis

Jim passara a última meia-hora tentando construir uma cadeia de eventos lógica que explicasse o seu atual paradeiro, deserto do Saara, trajando um terno preto com uma gravata de veludo vermelha por cima de uma camisa de cetim cinza, uma calça preta de veludo e sapatos de camurça azuis. O único fato que conseguiu confirmar foi o envolvimento de um magnífico peru assado. Já havia desistido do luxo de explicar a coisa toda e a sua própria vontade de escapar daquele inferno vinha timidamente atrás de um gigantesco impulso em direção ao cactus mais próximo. Precisava desesperadamente aliviar sua bexiga (o subconsciente de Jim tomou uma nota mental para lembrá-lo de procurar por água no interior da planta tão logo seus instintos mais imediatos fossem satisfeitos). Ao descer a samba-canção de seda verde e começar a aliviar sua bexiga Jim teve um sobressalto. Uma Ferrari vermelha vinha em sua direção ! Jim, na pressa de recolher sua uretra, acabou urinando nos sapatos, na samba-canção e nas calças. No entando não conseguiu pegar uma carona com a Ferrari que desapareceu no horizonte como uma miragem. Jim no entanto sabia não se tratar de uma ilusão de óptica causada pela refração dos raios solares na quentes camadas de ar da superfície do deserto pois conseguira ler dois adesivos na traseira do veículo: "se você só consegue me ver na faixa infravermelha do espectro estou dirigindo rápido demais." e "meu outro carro é um Porsche". 
Enquanto Jim lamentava ter perdido, simultaneamente, uma boa carona e uma excelente mijada, Clark, feliz proprietário de uma Ferrari, um Porsche e um espectômetro de massa lamentava que a mijada de Jim havia arruinado seu passeio pelo Saara. 

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Embriões e Cordeiros

Juca estava parado no corredor da morte e era eventualmente empurrado para frente, sem possibilidades de retorno. Ele possuía um problema numa das válvulas do coração que fazia com que o seu sangue venoso da sua pequena circulação localizado em um dos ventrículas se misturasse com o sangue arterial da sua segunda circulação no outro ventrículo (ou algo parecido, Juca não se lembrava de todos os detalhes médicos). Fato era de que Juca desde criança não podia jogar uma partida de futebol sem ficar extremamente cansado e adquirir um tom arroxeado em sua pele. O que atormentava Juca não era a morte eminente mas sim o conhecimento de que se ele pertencesse a uma classe econômica mais abastada ele poderia sobreviver por muitos anos ainda, vivendo uma vida completamente normal com um coração novo geneticamente compatível com o seu corpo, porém com uma válvula 100% operacional. O problema é que uma clonagem de coração típica custava alguns milhares de reais a mais do que o orçamento de carpinteiro de seu pai poderia pagar.

- Os caminhos de Deus são repletos de mistérios meu filho - consolava o padre no confessionário - Você deve ter perseverança para aceitar o que não pode mudar.

- Eu sei padre, eu sei de tudo isso. - Juca estava repleto de uma serenidade enigmática - O problema é o seguinte. Não consigo parar de pensar no fato de que se eu tivesse nascido na Europa, a renda que meu pai obteria com seu ofício seria o suficiente para pagar os meus cuidados médicos. Sabia que uma clonagem de coração na Europa custa menos que mil euros ?

- Deus não dá a ninguém algum problema sem que ela tenha a força necessária para superá-lo - recitou o padre depois de alguns segundos de desconfortável silêncio.

- Sim, eu também acho as passagens bíblicas consoladoras padre. Existe uma outra, repleta de sabedoria, que diz algo como "você colhe apenas aquilo que planta", não ?

- Você acha que cometeu algum pecado que causou a sua atual enfermidade meu filho ?

- Não, não. Não foi isso que eu quis dizer. Veja bem, a trinta anos atrás, quando meu pai ainda era adolescente, houve uma polêmica no Brasil com relação à pesquisa com células-tronco. A igreja, ou seja, vocês alegavam que era errado os cientistas da época continuarem com suas pesquisas utilizando células embrionárias, pois "desde o momento da concepção o ser humano é dotado de uma alma e seria um pecado acabar com tantas vidas em prolda pesquisa científica". O senhor se lembra disso, não ?

O padre não respondeu e, se Juca pudesse vê-lo através do semi-espelho do confessionário o veria baixar os olhos vergonhosamente.

Mesmo com a alegação dos cientistas que apenas utilizariam embriões que não teriam chance de se desenvolverem se por ventura fossem implantados em algum útero, o clero continuou batendo o pé gritando aos quatro ventos que não permitiria tal ato de "atrocidade". Veja só que ironia padre, que pensamento medieval em pleno século XXI ! Todo mês a mulher, no final do seu ciclo fértil, elimina um ou mais óvulos que não foram fecundados. No mínimo uma vida (ou metade de vida, se você preferir) por mês. O homem cada vez que ejacula realiza um espermicídio de milhões. No século XX já eram implantados meia dúzia de embriões perfeitamente saudáveis no útero de uma mulher com dificuldades em engravidar, com a esperança de que pelo menos um sobrevivesse. Ninguém dava muita bola para os irmãos de um bebê de proveta que morreram no caminho. Mas eles tinham que implicar com as células-troncos, não ? E os cordeirinhos tinham que seguir tudo o que os seus pastores pregavam. No final, os embriões que seriam utilizados morreram de qualquer jeito, porque eles não eram saudáveis o suficiente para serem implantados num útero com sucesso e agora, 30 anos depois, todo brasileiro que necessita de um órgão clonado precisa pagar uma fortuna para um país cujos cientistas tiveram a oportunidade de aprender a clonar órgãos e patentear a tecnologia. No fim das contas, vocês foram responsáveis pela morte de todos nós, enfermos da classe média para baixo, que não temos tal fortuna para pagar um procedimento médico que já é rotineiro nos países desenvolvidos.

Um silêncio de um ou dois minutos encheu o confessionário, atingindo a alma do padre como uma gélida brisa vinda diretamente dos pecados do passado, pecados seus, de sua classe e de seus "cordeiros". Sem saber direito o que dizer, por fim perguntou:

- Meu filho, o que você procura aqui ? O que quer de mim ?

- Não quero nada padre. O que foi feito já está feito. Só vim aqui hoje porque não sei quanto tempo me resta neste mundo e queria me despedir dele. O escolhi como representante de sua classe por mera conveniência. Era a igreja mais perto do meu leito de morte. Minha família tentou me coagir de tal idéia, porém eles não se sentem à vontade negando os últimos desejos de um morimbundo. Estou indo agora Padre. Se você quiser, reze suas ave-marias e seus pai-nossos você mesmo. Porém eu não teria muitas esperanças de que fosse adiantar alguma coisa. Adeus Padre. Te vejo no inferno...

terça-feira, 15 de julho de 2008

O Pássaro e o Espelho

Ah... o amor!


Esta incrível necessidade que temos em projetar nós mesmos em outro ser.
Como um Narciso em sua procura desesperada por um límpido e reflexivo lago onde ele possa enxergar aquilo que há de melhor nele mesmo.
O ódio despertado pela visão de horroridades que não gostaríamos nunca de ver.
Como uma Medusa que evita espelhos temendo a petrificação.


O que nos move em tão desesperada ventura ?

Um reles ego que procura sem cessar se inflamar até explodir em um milhão de infinitesimais fragmentos ?

Ou, quem sabe, seja o mesmo sentimento que faz um pássaro engaiolado desatar alegremente em lindos cantos ao avistar o espelho da cozinha ?

Sonhos de liberdade ?

Alívio da solidão ?

A perspectiva de compaixão ?

Quem sabe ?

domingo, 13 de julho de 2008

terça-feira, 6 de maio de 2008

Mutação

A tênue linha que separa o gênio do louco é uma mera questão de sucesso ou fracasso.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Meio Período

Mais um dia, mais uma luta. Carlos estava ainda dormindo enquanto esperava o elevador chegar ao seu andar. Se pegou pensando novamente nas frases que já estava cansado de ouvir: "Deixa de ser vagabundo. Você é um irresponsável, acordando todo dia meio-dia. Você não tá com a vida ganha, tá ? ". Nessas horas, Carlos pensava nas tartarugas e em suas vidas longas, graças à sua mania de cuidar da própria vida e deixar que os outros façam o mesmo. Quanta coisa ainda o ser humano teria que aprender com o mundo que o cerca...

- Boa tarde - Carlos saudou as pessoas que enchiam o elevador.
- Boa tarde - As pessoas que enchiam o elevador o saudaram de volta, com exceção de um senhor baixinho com um índice de massa corpórea um pouco acima do "normal", ou seja, acima de 25.
- Boa tarde não, não almocei ainda. Bom dia ! - respondeu o senhor baixinho com índice de massa corpórea igual a 28, vestindo um sorriso zombeteiro em seu rosto.
- Verdade né ? - riu Carlos
- Tem dias que eu nem trago marmita. Sabe como é, pessoas como a gente não podem comer muito não. Ai o dia demora a passar, só chega a tarde as 18 horas, quando chego em casa e almoço.
- O bom disso é que o senhor trabalha apenas meio período nesses dias. - Carlos acrescentou com uma seriedade disfarçada.

À chegada ao térreo do elevador, Carlos e o porteiro do prédio que trabalhava apenas meio-período se despediram com um "Tenha um bom dia / Você também." Memórias da infância de Carlos o invadiram, frases como "Uso meu senso de humor como proteção, válvula de escape, como anestésico para as adversidades da vida..." vieram à tona. Num suspiro de compreensão, Carlos confessou a si mesmo:

-É, funciona mesmo!

sábado, 15 de setembro de 2007

The Dark Angel

- Você tá dando bandeira hein ?

- Oi ?

- Acabou de chegar no bar completamente embriagado - havia um ar de gozação no semblante da misteriosa mulher de preto - Dando a maior bandeira !

- He, he - ele sorria sem graça - sou culpado mesmo.

E a fascinante conversa, que começara de maneira tão brincalhona, tão pura, inocente e culpada, durou alguns minutos que cheiravam a eternidade. Ele ouvia prazerosamente ela descrevendo, de uma maneira teatral, espontânea e divertida, como ela havia acabado de levar um "bolo". Ele, a sondando de maneira sutil e eficiente, pedia para ela avisá-lo se o seu encontro aparecesse e ela, misteriosamente e com classe, o confortava, dizendo que provavelmente não iria rolar nada com eles.
E mais e mais ele a conhecia e gostava da alma da misteriosa dama de preto. Nunca antes havia sentido um sintonia tão forte em tão pouco tempo. Mais de uma vez disfarçou com um riso amarelo a total assombro e falta de palavras que sentia em contemplar aquele anjo naquele bar. Um anjo que havia levado um bolo e colocado, de maneira aletória, em sua vida.
Quando ela começou a falar de destino, de coisas maiores que o ser humano, das invisíveis e inevitáveis forças que regiam a vida de todas as almas, ele sabia que o beijo não tardaria a aparecer, de uma forma natural, mágica, mística. Foi quando a tomava em seus braços que ele ouviu a frase seca:
- Eu preciso ir ao banheiro.
- Ao banheiro ?
- Sim, ao banheiro.
E era isso, ele nunca mais a viu. Provavelmente escapou pela janelinha de ventilação do banheiro feminimo. Ou talvez do masculino ? Não ousarei discutir sexo aqui, mas anjos definitivamente possuem intestinos!




sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Os Sete Suspiros

Quando ele viu, ja havia sido feito e nada mais reverteria a situação. Havia sentado em cima do saco de suspiros, havia sentido os pobrezinhos se despedaçarem perante o seu peso. Era uma pena.

Toda a expectativa pelo prazer que ele havia acumulado desde que comprara o saco de suspiros. Não iria sentir aquela sensação de mascar um chiclete comestivel simultaneamente ao instante em que voce colocou uma colher inteira de açúcar na boca. Em suas mãos segurava o saco cheio do que era constiuida a meia duzia de doces a base de açucar e ovo que tanto haviam chamado a atenção dele no mercado. Meia duzia não, cinco. Ele a havia comido um na saida do mercado, no dia anterior. Ele nem era o maior fã de suspiros que ele conhecia, mas ele havia sido realmente uma boa experiência sensorial.

Ao inserir migalhas de suspiros em sua boca, ele se surpreendeu ao notar que o gosto coninuava muito bom. Melhor ainda, ele ousaria dizer. A trituração, ele imaginava, fez com que uma area maior de sua lingua ser coberta pelo alimento, o que explicava o aumento no prazer da experiência.

Nada fazia sentido ! Por que suspiros eram vendidos inteiros, se eles era muito melhores triturados ? "Ha algo de podre no reino da Dinamarca". Enquanto ele recitava Shakespeare, sua mão encontrou algo estranho no saco de migalhas, anteriormente conhecido como saco de suspiros. Sim, ele não havia se enganado, um suspiro inteiro havia resistido bravamente contra o processo de esmigalhamento, talvez protegido pelos seus desafortunados vizinhos. Sem saber direito como ele havia chegado em suas mãos, ele contemplava o suspiro inteiriço, suas simetrias, suas irregularidades, sua identidade !

E então, na primeira mordida, ele sentiu. Sentiu todo o prazer daquela estrutura complexa sendo tritura em sua boca, prazer este que havia sido destruido no processo de trituração "Deuterestômio" ( Aquele bixo cujo ânus surge antes da boca, como você !). Havia entendido o porquê de Suspiros serem vendidos inteiros, mas se confundiu mais ainda. Era um belo de um paradoxo este com o qual ele havia esbarrado, ou melhor, sentado em cima.

Num subito estalo ele havia entendido ! Ambas as coisas eram boas demais, mas apenas uma delas sozinha enjoava rapido. A variedade era o tempero que o fazia começar a gostar de suspiros novamente. Ao se dar conta que havia resolvido aquele dilema, suspirou aliviado.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

É a vida, é bonita, é bonita...

Viver é a coisa mais difícil que já fiz.

Certeza !

Amém !