domingo, 31 de agosto de 2008

Cenouras e Chicotes

Existem basicamente dois meios de fazer com que um cavalo puxe sua carroça: o chicoteando por trás para que ele vá para frente fugindo da dor ou pendurando em sua frente uma suculenta cenoura para que ele vá para frente em busca do prazer antecipado da saciez. Temos, pois, dois pólos opostos governando o movimento de um cavalo de carroça: Repulsão e Atração, Dor e Prazer.

Para se aumentar a intensidade de tais forças irresiitíveis podemos adotar duas abordagens principais. Aumentar a dor que o chicote causa ou intensificar a fome do animal aumentando assim, indiretamente, o prazer que ele sentirá ao degustar o desejado vegetal.

Entre os homens, tal processo de gratificação e punição, muito embora seja dotado de uma maior complexidade, segue basicamente o mesmo padrão. Para se conseguir com que um homem faça algo você pode, novamente, adotar duas posturas: prometendo-lhe uma agradável recompensa ao final da tarefa (uma barra de chocolate, uma noite de sexo selvagem, um salário mínimo, uma vida feliz num eterno paraíso celestial, etc...) ou o amedrontando com terríveis ameaças (um mês de castigo, castidade involuntária, desemprego, uma eternidade de danações no fogo eterno, etc...). Novamente dois pólos: Prazer e Dor.

Todo condutor de carroça sabe que um chicote é mais eficiente do que uma vareta com uma cenoura amarrada na ponta para motivar a propulsão de seu veículo. Um cavalo não ligará para uma cenoura se ele estiver saciado, porém sempre fugirá de um doloroso açoite.

Infelizmente, homens e cavalos ainda possuem muito em comum quanto ao quesito motivação...

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Embriões e Cordeiros

Juca estava parado no corredor da morte e era eventualmente empurrado para frente, sem possibilidades de retorno. Ele possuía um problema numa das válvulas do coração que fazia com que o seu sangue venoso da sua pequena circulação localizado em um dos ventrículas se misturasse com o sangue arterial da sua segunda circulação no outro ventrículo (ou algo parecido, Juca não se lembrava de todos os detalhes médicos). Fato era de que Juca desde criança não podia jogar uma partida de futebol sem ficar extremamente cansado e adquirir um tom arroxeado em sua pele. O que atormentava Juca não era a morte eminente mas sim o conhecimento de que se ele pertencesse a uma classe econômica mais abastada ele poderia sobreviver por muitos anos ainda, vivendo uma vida completamente normal com um coração novo geneticamente compatível com o seu corpo, porém com uma válvula 100% operacional. O problema é que uma clonagem de coração típica custava alguns milhares de reais a mais do que o orçamento de carpinteiro de seu pai poderia pagar.

- Os caminhos de Deus são repletos de mistérios meu filho - consolava o padre no confessionário - Você deve ter perseverança para aceitar o que não pode mudar.

- Eu sei padre, eu sei de tudo isso. - Juca estava repleto de uma serenidade enigmática - O problema é o seguinte. Não consigo parar de pensar no fato de que se eu tivesse nascido na Europa, a renda que meu pai obteria com seu ofício seria o suficiente para pagar os meus cuidados médicos. Sabia que uma clonagem de coração na Europa custa menos que mil euros ?

- Deus não dá a ninguém algum problema sem que ela tenha a força necessária para superá-lo - recitou o padre depois de alguns segundos de desconfortável silêncio.

- Sim, eu também acho as passagens bíblicas consoladoras padre. Existe uma outra, repleta de sabedoria, que diz algo como "você colhe apenas aquilo que planta", não ?

- Você acha que cometeu algum pecado que causou a sua atual enfermidade meu filho ?

- Não, não. Não foi isso que eu quis dizer. Veja bem, a trinta anos atrás, quando meu pai ainda era adolescente, houve uma polêmica no Brasil com relação à pesquisa com células-tronco. A igreja, ou seja, vocês alegavam que era errado os cientistas da época continuarem com suas pesquisas utilizando células embrionárias, pois "desde o momento da concepção o ser humano é dotado de uma alma e seria um pecado acabar com tantas vidas em prolda pesquisa científica". O senhor se lembra disso, não ?

O padre não respondeu e, se Juca pudesse vê-lo através do semi-espelho do confessionário o veria baixar os olhos vergonhosamente.

Mesmo com a alegação dos cientistas que apenas utilizariam embriões que não teriam chance de se desenvolverem se por ventura fossem implantados em algum útero, o clero continuou batendo o pé gritando aos quatro ventos que não permitiria tal ato de "atrocidade". Veja só que ironia padre, que pensamento medieval em pleno século XXI ! Todo mês a mulher, no final do seu ciclo fértil, elimina um ou mais óvulos que não foram fecundados. No mínimo uma vida (ou metade de vida, se você preferir) por mês. O homem cada vez que ejacula realiza um espermicídio de milhões. No século XX já eram implantados meia dúzia de embriões perfeitamente saudáveis no útero de uma mulher com dificuldades em engravidar, com a esperança de que pelo menos um sobrevivesse. Ninguém dava muita bola para os irmãos de um bebê de proveta que morreram no caminho. Mas eles tinham que implicar com as células-troncos, não ? E os cordeirinhos tinham que seguir tudo o que os seus pastores pregavam. No final, os embriões que seriam utilizados morreram de qualquer jeito, porque eles não eram saudáveis o suficiente para serem implantados num útero com sucesso e agora, 30 anos depois, todo brasileiro que necessita de um órgão clonado precisa pagar uma fortuna para um país cujos cientistas tiveram a oportunidade de aprender a clonar órgãos e patentear a tecnologia. No fim das contas, vocês foram responsáveis pela morte de todos nós, enfermos da classe média para baixo, que não temos tal fortuna para pagar um procedimento médico que já é rotineiro nos países desenvolvidos.

Um silêncio de um ou dois minutos encheu o confessionário, atingindo a alma do padre como uma gélida brisa vinda diretamente dos pecados do passado, pecados seus, de sua classe e de seus "cordeiros". Sem saber direito o que dizer, por fim perguntou:

- Meu filho, o que você procura aqui ? O que quer de mim ?

- Não quero nada padre. O que foi feito já está feito. Só vim aqui hoje porque não sei quanto tempo me resta neste mundo e queria me despedir dele. O escolhi como representante de sua classe por mera conveniência. Era a igreja mais perto do meu leito de morte. Minha família tentou me coagir de tal idéia, porém eles não se sentem à vontade negando os últimos desejos de um morimbundo. Estou indo agora Padre. Se você quiser, reze suas ave-marias e seus pai-nossos você mesmo. Porém eu não teria muitas esperanças de que fosse adiantar alguma coisa. Adeus Padre. Te vejo no inferno...

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

A Máscara Caida

São nos momentos de necessidade que as pessoas têm a chance de mostrarem verdadeiramente o seu caráter. Algumas mantém a imagem que pintam de si mesmas, outros revelam quem na realidade são. Resta-nos nos afastarmos daquelas cujas máscaras caídas escondiam grotescas feições e reforçarmos a confiança nas máscaras ainda firmes em seus lugares, com a esperança de que escondam por detrás delas um brilhante e salutar feixa de luz ao invés de famintas e vorazes trevas...

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Abbey Road

Notem como um pedestre atravessando a famosa Abbey Road precisa esperar pouquíssimos segundos antes que os carros parem para ele poder atravessar a rua pela faixa de pedestres. E notem como ninguém atravessa a rua fora da faixa. Me pergunto porque as coisas são tão diferentes na Avenida Copacabana.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Falando demais por não ter nada a dizer...

"Sabe do que é feito o papel ? Canhamo... (segundos de silêncio depois) Agora só não me pergunte o que é canhamo." - Oscar Schmidt comentando a abertura das olímpiadas 2008 na China.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

A árvore e a floresta

Eu entendo o mundo, mas não espero que o mundo me entenda...